Encanto Aventureiro
Além de refletir meu encantamento pela natureza humana, o documentário "Encanto Aventureiro",é resultado do meu trabalho de conclusão do curso de jornalismo, feito em parceria entre a UFRJ e UFRN. Aqui você encontra momentos de conversa com os caiçaras, moradores da praia de Aventureiro-Ilha Grande-RJ, sobre casamento, amor e segredos da união.
quarta-feira, 25 de maio de 2011
terça-feira, 24 de maio de 2011
Caminhos do trabalho
Na tentativa de chegar ao final da graduação de comunicador social com um projeto que provoque reflexão nas pessoas quanto ao seu modo de vida, foi desenvolvido o produto desse trabalho de conclusão de curso, uma reportagem audiovisual que se caixa no gênero documentário, com tema amor.
Por meio da conversa e convivência, se pesquisou a população da praia de Aventureiro. Durante uma semana, jovens, adultos e os mais velhos foram filmados falando sobre suas percepções nos relacionamentos amorosos, fornecendo depoimentos, que embasaram o eixo central de conteúdo do produto, intitulado “Encanto Aventureiro”.
Localizada na parte sudoeste da Ilha Grande, pertencente ao município de Angra dos Reis, no estado do Rio de Janeiro, Segundo dados do IBGE, a Praia de Aventureiro apresenta 600m de areia, possui 54 construções, 42 famílias com cerca de 150 pessoas, que terminam por integrar uma grande família, já que há grau de parentesco entre todos os habitantes. Agrega uma modesta vila de pescadores que durante o verão, trabalha em torno do turismo e da pesca. Ainda conserva áreas de mata atlântica praticamente intocáveis pelo homem. Não possui hotéis nem pousadas, o turismo praticando na região é considerado ecológico, com acomodações apenas em campings nos quintais das casas dos moradores, que também alugam quartos em modestas condições.
Apesar do desenvolvimento trazido pelo turismo após a desativação do Instituto Penal Cândido Mendes em 1994 na Vila Dois Rios, Aventureiro vem apresentando um retardado “desenvolvimento” em relação à muitas praias da Ilha Grande. A localização em mar aberto, com difícil acesso, influenciou desde o início a lenta acumulação humana, mas as duas unidades de conservação da natureza pertencente à categoria de Proteção Integral: a Reserva Biológica da Praia do Sul (1981) e o Parque Estadual Marinho do Aventureiro (1990) é realmente o que vem impondo limites, mantendo o traço nativo da região.
Tais iniciativas, à principio, não permitiriam a presença de moradores nessas áreas, mas as famílias já possuíam raízes no local muito antes disso, então, a população permaneceu, só que com alguns limites, que geram sentimentos ambíguos entre os caiçaras sobre a questão. Há uma insatisfação com a liberdade sobre o uso de suas terras, onde não se pode construir nem ampliar o que já existe. Por outro lado, se sentem mais protegidos da especulação imobiliária, presente em grade parte da Ilha Grande.
Caiçaras ou Pagecos, como são chamados os que nascem em Aventureiro, por conta das leis ambientais, sobrevivem praticamente sem luz elétrica, apenas com gerador entre 18h e 22h. Estão a duas horas e meia do continente por barco, distante 7.000m e quatro horas distantes (ida e volta), por uma trilha de árduas subidas, da praia mais urbanizada, chamada Provetá, onde estudam os jovem a partir do quinto ano ginasial. É no pico dessa trilha que vão os que pretendem usar o celular. Não há sinal em toda praia, é realmente uma região que se encaixa na descrição da gíria “roots”, lugar com precários elementos de urbanização.
Com a ação por impulso profundamente incutida na conduta cotidiana pelos poderes supremos do mercado de consumo, seguir um desejo é como caminhar constrangido, de modo desastroso e desconfortável, na direção do compromisso amoroso. (BAUMAN, 2004, P.27)
A escolha da população da Praia de Aventureiro como personagens, foi fruto de uma grande paixão, mas não com as percepções distorcidas naturais desse sentimento, pelo lugar. A segurança e o inexistente índice de criminalidade são dados que podem ser comprovados por quem visita a praia.
Além da indiscutível beleza do lugar, com exuberante mata atlântica e diversidade marinha, essa real sensação de segurança, que possibilita a dormida em barracas de campings e longas caminhadas por trilhas desertas sem temer à agressão humana, torna quase que mágica a realidade daquele vilarejo. Aventureiro funciona como um mundo à parte, sendo uma oportunidade de conhecer a pureza humana, algo praticamente impossível de encontrar ou exercer em meio aos agrupamentos humanos nas metrópoles.
Pode parecer e realmente é muito vago falar de pureza humana, assim vale tentar explicar como se chegou a essa conclusão, uma vez que existem sim outros lugares também paradisíacos que apresentam segurança para o turista e vida pacata aos moradores. O diferencial de Aventureiro é a união da comunidade.
Justificar essa pureza é refletir sobre o modo de vida das famílias caiçaras, desenvolvidas a partir do trabalho na roça, trazendo nas entranhas o peso da enxada com sol forte na cabeça. É um povo sofrido, como relata a professora e coordenadora da única escola do vilarejo, Jeana. “Aqui, todos trabalham muito, quase não há tempo para o lazer, principalmente as meninas, ainda é uma sociedade patriarcal”. Jeana é natural de Angra os Reis e casou-se com um caiçara, logo representa uma visão diferenciada dos que lá nasceram.
Vale ressaltar essa ligação com o trabalho como indicador da vitalidade entre os mais idosos e afastamento do alcoolismo, trazendo os benefícios que uma mente ocupada pode proporcionar. O produto desse trabalho não pretende, entretanto, encontrar explicação exata para o modo harmonioso de vida que esse povo consegue viver. Isso é um mistério que não se pretende desvendar, apenas refletir sobre.
A materialização desse produto sobre a forma de documentário busca não apenas atingir o âmbito acadêmico, mas exercer um dos princípios éticos do comunicador social e da extensão universitária, fazendo do conhecimento adquirido, nesses quatro anos, um meio de prestação de serviço tanto à população caiçara quanto à metropolitana.
Gerando um elemento midiático alternativo, a construção e resultado do produto deste trabalho provoca uma reflexão desse povo sobre ele mesmo, criando um lugar de reconhecimento para essa população, que dificilmente encontra espaços de identificação na grande mídia, sendo colocados à margem da globalização.
Acrescentar ao campo da comunicação elementos fora dos padrões atuais, criando canais de representação para comunidades que geralmente são representadas por modelos estereotipados, vem a somar ao compromisso ético da comunicação, que deve revelar os verdadeiros anseios de um povo e não o modelo convenientemente rentável desses anseios. Raquel Paiva relaciona esse fenômeno com a Globalização: “A globalização instala-se muito mais como uma postura de mercado, um ordenamento da atuação das megaempresas, as Transnational Corporetions”. (PAIVA, 1998, p.4,).
A fim de criar alternativas a esses modelos rentáveis, é preciso refletir sobre o modo como um dos mais abrangentes meios de comunicação, a TV, funciona. Atentando não apenas para o conteúdo, mas para a forma de construção do discurso audiovisual, percebe-se uma constante busca pela velocidade da informação, pela síntese.
Um plano de dois minutos não pode. Ninguém fala mais de trinta segundos. E está cada vez pior: hoje não há planos de oito segundos, um plano fixo de oito segundos é inconcebível, não só para o Jornal Nacional. Estou falando de reportagens especiais. (LINS. 2004, p.21)
O produto aqui proposto busca alternativas não apenas no conteúdo, mas sobretudo na forma, tentando valorizar ao máximo o depoimento dos entrevistados. Planos longos, que podem, por exemplo, revelar momentos de silêncio em uma entrevista surgem como recursos, muitas vezes mais fortes do que o encadeamento do discurso. Funcionam como um meio de reflexão ao expectador. Segundo o documentarista Eduardo Coutinho o plano longo é essencial, é o que tem o acaso, o tempo morto, que interessa muito mais do que o tempo vivo.
Uma vez definido o tema, é necessário esclarecer o que motivou sua escolha, como afirma Barros e Junqueira: “Uma vez escolhido o tema da futura pesquisa, é conveniente o pesquisador descrever qual foi sua trajetória individual até chegar a ele- como se sentiu atraído por ele?” (BARROS e JUNQUEIRA. 1970,p.98).
A necessidade de estender o aprendizado acadêmico para além do campo da pesquisa surgiu no ano de 2007 e começou a ser executada com o projeto de extensão “Vila Comunica”, desenvolvido nesse mesmo ano, na Vila de Ponta Negra, região humilde da cidade de Natal-RN. Com temática semelhante, mas abordagem diferente, outro projeto de extensão também se realizou no Arquipélago de Fernando de Noronha, em janeiro de 2008. Em ambos os casos, foram produzidos jornais comunitários, cujas pautas foram decididas, através de debate, com a população local.
Surge novamente, nesse trabalho de conclusão de curso, a tentativa de estender o aprendizado acadêmico para além da pesquisa, agora na linguagem audiovisual. A idéia de filmar as entrevistas e construir um documentário sofreu forte influência da trajetória seguida em agosto de 2008, quando o programa existente entre as Universidades Federais do país, a mobilidade estudantil, possibilitou a permanecia de três semestres do curso de comunicação social- jornalismo- na Universidade Federal do Rio de Janeiro- UFRJ.
Paralelo a essa permanecia, o estágio como repórter na Coordenadoria de Comunicação da UFRJ, no setor de audiovisual, proporcionou prática diária com todas as etapas da linguagem audiovisual, envolvendo apuração de pautas, produção, entrevistas, textos, decupagem e edição. Foi um período de intenso aprendizado, experimentando pela primeira vez a autonomia de estar na rua com uma equipe interagindo nas mais diversas áreas de conhecimento, em todos os assuntos que envolviam a UFRJ. Foi, sobretudo, uma época de entendimento da relação entre entrevistador e entrevistado, percebendo as diferenças de abordagem para cada entrevistado, descobrindo formas singulares de interação que apenas a relação diária com o outro proporciona. Experiência que se converge, lógico que em proporções diferentes, ao que conta Coutinho, em livro da professora Consuelo Lins, sobre sua experiência na TV Globo antes de se tornar documentarista.
Foi uma experiência extraordinária. Aprendi a conversar com as pessoas e a filmar, aprendendo ao mesmo tempo as técnicas de televisão, de filmar chegando, filmar em qualquer circunstância, pensando em usar depois de uma forma diferente (...)( COUTINHO, apud LINS. 2004, p.20)
Com base nessa experiência e nos outros projetos de extensão já mencionados, irá se criar através deste trabalho um meio em que a população local possa se sentir representada, valorizada e, ainda, se comunicar com seu próprio meio social, já que a grande mídia massifica a informação, unificado-a em todos os meios. Nesse contexto, portanto, as populações mais afastadas encontram espaço reduzido na mídia, o que impede o diálogo dessas comunidades tanto com a sociedade mais ampla como no interior da própria comunidade local.
(...) o monopólio das comunicações conta com vários meios integrados, transmitido de forma complementar. Um cidadão acorda e liga a TV, vai para o trabalho escutando rádio ou lendo jornal, volta para sua casa e liga de novo a televisão. Se vai acessar a internet e quer se informar, abre primeiro um grande portal, que também é de propriedade de um grande grupo econômico da mídia. Este cerco vicioso é uma espécie de ditadura que tem de ser combatida. (GIRARDI e JACOBES. 2009, p.34).
Além de provocar uma reflexão sobre o amor, este produto é uma proposta alternativa à grande mídia, abre espaço ao reconhecimento e valorização do caiçara tanto no seio da comunidade como para a sociedade metropolitana.
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